quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Com três furinhos apenas...

As maquinetas ruidosas que me mostraram o
mundo das drogas injetáveis
Se tira um apêndice. Tinha tido um dor passageira há cerca de duas semanas mas não liguei. Devem ser gases disseram na altura. Anteontem de madrugada a dor era bem mais intensa e claramente não passageira. Depois de uma passagem pela clínica da empresa fui para as urgências de um hospital, felizmente já com uns analgésicos no sistema. Ainda foi grande a espera entre análises ao sangue, ecografia e diagnóstico do médico. Apêndice inflamado, glóbulos brancos em alta e dores características. Tempo de chamar o cirurgião e planear a operação para o próprio dia. Umas horas depois lá vesti a bata e roupa interior especiais para a ocasião. Suspeito que para além de dar jeito para os médicos e enfermeiros sirva para o paciente se sentir ridículo e incapaz e consequentemente colaborante. Só me lembro de o médico me dizer para sonhar com coisas boas como as praias do Algarve e de acordar (?horas) depois com uns empurrões das enfermeiras que arrumavam a sala e queriam despachar o paciente para o quarto. Um serão meio grogue e noite com vários períodos de sono e acordar para se mudar o soro. Boa recuperação e alta no dia seguinte. Ainda bem que não fiquei mais tempo. Os dois canais de Bollywood, apesar de terem um repertório que vem dos anos 70 começavam a fatigar. Já começava a reconhecer alguns actores. A qualidade clínica é boa, apesar de o médico anestesista me ter tido que tudo pode acontecer, mas InshAllah vai correr tudo bem. Allah foi grande. E a parte administrativa é digna de um filme de comédia. Começou por me ser dito no balcão das urgências (têm uma entrada especial para essa parte) que tinha de ir até ao outro lado do edifício para me registar e trazer de lá os papeis. Depois, já numa cama, pedirem à esposa grávida de 9 meses para ir carimbar uns papeis ao mesmo balcão do outro lado de edifício. "Mas acabe o seu pequeno almoço, não tenha pressa". E a cereja no topo do bolo foi terem dito para ir pagar ao piso debaixo, trazer de lá os papeis para depois me darem alta. Aí o copo transbordou e as evidências de uma grande barriga e um apêndice recém retirado fizeram com que abrissem uma excepção e me dessem a alta sem os papeis.
Em Bollywood as estórias de amor são ainda mais lindas
Esta é a estória feliz de um expat que trabalha numa empresa que cobre todas (ou quase) estas despesas no melhor hospital do país. Os locais têm acesso aos hospitais públicos. Os expats só em caso de urgência grave, como um acidente de automóvel. Para quem não tem nacionalidade omanita sobram os privados, que vão desde a clínica de esquina a hospitais completos mas que nunca chegam aos padrões de Portugal - sim temos um sistema de saúde bastante bom acreditem. Quem emprega expats tem, segundo a lei, de dar um seguro de saúde ou algum tipo de cobertura. Isso é a realidade para os expats qualificados, mas infelizmente muito longe dela para os expats indiferenciados que trabalham nas obras e outros trabalhos mal pagos.

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

O Outono é como o Verão

Maio em Omã
Já vos tinha falado do clima e de como é quente. O Verão cá não tem comparação, como um dia de Agosto no Alentejo em que a humidade está muito alta, multiplicado por 120 dias... com o bónus de não ficar melhor à noite. Há com certeza saunas mais frescas do que o Verão arábico. Um relato comum de quem vive cá há umas décadas é o hábito dos locais - e suponho que dos expatriados - durante o Verão, dormir nos terraços (algo semelhante às açoteias algarvias) com o mínimo de roupa que os costumes permitem e de hora em hora ir encharcar o lençol em água e tentar voltar a dormir. Viva a tecnologia do freon.
A partir de Setembro e, com sorte, no final de Agosto a humidade começa a baixar. Durante o Verão estamos normalmente nos 70-80%. As temperaturas por vezes até ficam mais altas, passam dos 30-35ºC para dias em que chegam perto dos 40ºC mas sem o bafo quente e húmido de abrir o forno ou, numa analogia que acho mais apropriada, ficar a apanhar o bafo de uma turbina de avião. Assim, mesmo nos dias quentes, à sombra e com uma brisa fica suportável e perto da água passam-se serões bem agradáveis. E as noites são amenas. Devo dizer que é um alívio. Respira-se bem. Pode-se começar a desligar o ar condicionado durante a noite - as casas são mal isoladas de modo que a climatização é essencial. Para um português sabe a Verão. E sabe bem.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Escorpiões e o catano

Foto tirada por um amigo perto da sua casa aqui em Mascate
Nos filmes do Indiana Jones e muitos dos sucedâneos, quando passam pelo deserto há sempre um ou muitos escorpiões para além de outra bicharada exótica para meter nojo e quase matar alguém.
Não vou desmentir, eles existem e não apenas em zonas longínquas do país. Temos vários vizinhos em plena urbe que os descobrem em caixas ou qualquer sítio onde caibam. Ainda ontem vimos um durante um barbecue na casa de amigos. Felizmente costumam ser dos amarelos cuja picada dói mas em princípio não mata.  Se for um adulto. Se for saudável. Se não for alérgico.
Entre outra bicheza simpática que se pode encontrar por este país fora estão aranhas - parece que só uma espécie introduzida é muito venenosa, as outras são só um pouco venenosas; aranhas escorpião - um tipo de artrópodes não venenoso, mas que pica e come pequenos animais (incluindo escorpiões!); cobras - algumas pequenas víboras e outras bem maiores, algumas venenosas. Já vi de todas embora os encontros tenham sido de terceiro grau. Outra bicheza que noutras paragens não traz problemas são os gatos, mas que aqui, visto que quase não há cães, tomam conta dos espaços urbanos, em particular os caixotes dos lixo. E tornam-se muito territoriais, com lutas de rua que acordam a vizinhança a meio da noite
Muitos destes bichos gostam de ficar na sua e não chatear. Infelizmente isso significa entrar para sapatos, caixas e outros objectos humanos. Recentemente uma colega pediu umas caixas do arquivo da empresa que foram entregues no seu gabinete. Eis que, ao abrir uma delas saltou de lá o que ela descreveu como um escorpião! Fugiu dali e o gabinete foi fechado e selado até chegar a equipa de controle de pragas. O burburinho foi grande na empresa e todos tentavam ver o bicho pelo vidro do gabinete. Passado algum tempo venceu a timidez e começou a passear pelo chão. Mas andava lateralmente e não tinha "cauda"... Era de facto um artrópode mas não mais do que um caranguejo. A desilusão foi grande, toda a gente queria ver um escorpião. Este nem consegue picar...

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

De A para B. C é de carro.

O motivo foi levantar o carro à oficina. E quem não têm carro em Omã entra num mundo diferente. Para muitos, infelizmente, isso significa uma vida de trabalho duro, andar muitos kilometros a pé com temperaturas acima dos 35°C e uma humidade asfixiante.
Não foi certamente o caso. As temperaturas estão mais baixas - já baixa dos 30°C durante a noite - e só tive de descer a rua. E apesar de estar nesta casa há vários meses foi a primeira vez que o fiz... Toda a cidade e vida das pessoas está  desenhada para tudo se fazer de carro. É em parte comodismo, mas durante pelo menos 4 meses do ano andar na rua é um suplício. Para além disso os passeios são poucos e descontinuos e há grandes áreas de Mascate que são cortadas por autoestradas sem ligações para peões. E transportes públicos resumem-se a pequenas carrinhas geralmente sobrelotadas que fazem as principais artérias da cidade.
O passeio foi agradável apesar de não estar a conseguir apanhar táxi para a oficina. Eis que entra em jogo o factor local. Um simpático senhor ao ver- me a procurar táxi perguntou num inglês simples se eu queria carro. Por momentos pensei que tinha o seu próprio negócio de táxi oficioso. Perguntei para onde ia e tive como resposta a mesma pergunta. Não fiquei menos desconfiado, mas ao responder à pergunta disse-me que ia para essa zona. E assim tive uma boleia que nem tive de pedir, uma agradável conversa e ainda poupei uns reais. Já tínhamos ouvido relatos e tido a experiência de boleias abundantes. O outro lado da moeda é que quem anda a pé espera também boleia. A técnica é mandar parar o carro e entrar sem perguntar. Diz-se para onde se quer ir e o facto está consumado. Felizmente ou não é um hábito comum nas zonas rurais, mais raro em Mascate.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Eid Mubarak

Harees. Retirado de outro blog sobre Omã muito interessante.
O mês do Ramadão é tempo de privação, caridade e contacto com o divino. É também tempo de acidentes na estrada, gente sem paciência e sonolenta, mas sobre isso já falámos. O Eid al-Fitr, celebrado nos dias seguintes ao Ramadão, retira a parte da privação e devolve sorrisos ao locais (e reduz um pouco os perigos da estrada). O Governo ou o próprio Sultão define o número de dias deste feriado (raramente os feriados neste país são de apenas um dia). Por vezes começa mesmo antes do fim do Ramadão como foi este ano. Dura normalmente uma semana ou mais, de modo que toda a gente se queixou da duração este ano - foram só 4 dias mais um fim-de-semana...
Arsia, a versão com arroz e frango
Assim como havia comidas especiais para o Iftar - a quebra do jejum - há também para o Eid. Segundo a tradição local come-se harees, na variante local uma mistura de flocos de aveia (e outros cereais?) muito cozinhado com carne de vaca, ervas e por vezes tâmaras. Os panelões raramente têm menos de 50kg... Há também a versão com arroz, chamada Arsia. Os locais reúnem-se em grandes grupos de família, amigos e vizinhos. É também altura de visitar família que não se vê durante o ano. A parte da caridade envolve doar dinheiro, roupa ou outros produtos aos mais pobres ou a instituições. E claro partilhar as refeições com quem não tem acesso fácil a elas. Toda a gente, empresas e instituições desejam um Eid Mubarak, votos de um santo Eid. Esse ambiente de partilha é visível durante todo o ano, mas particularmente evidente durante esta altura. Não sei se é herança árabe, mas nós também temos o hábito de convidar para uma refeição quando encontramos alguém conhecido. Aqui convida-se qualquer pessoa.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

As Sawadi

O "concheiro" de As Sawadi
Aproveitando o fim do Ramadão e as férias a que, obviamente, se tem direito porque é o fim do Ramadão seguimos para um local perto de Mascate mas longe o suficiente para saborear o tempo livre. A costa de Batina que se estende desde Mascate até à fronteira com os Emirados é uma zona aplanada entre as montanhas Hajar no interior e o Oceano Índico. É e foi historicamente uma zona densamente povoada (para padrões de países desérticos como este) visto que as chuvas, mais abundantes nas montanhas, alimentam durante todo o ano os aquíferos de toda esta planície. Foi também uma zona controlada pelos Portugueses durante o período de ocupação. Na verdade só as praças fortes como a de Barka (Borka nos mapas Portugueses da época). Ainda hoje há um forte, atualmente reconstruído mas ocupado pelos portugueses durante o tempo que cá estiveram.
Outra fortificação, mas que suponho bem mais recente, está na ilha de Sawadi. A linha de costa de Batina é incrivelmente reta, mas tem um pequeno cabo formado pela influência de uma ilha - suponho que por erosão diferencial que deixa umas ilhas ao largo da costa - a apenas umas centenas de metros do continente. 
Vista da praia para Este, com a ilha Sawadi ao fundo
Os ventos predominantes de Este e respetiva ondulação fazem com que a praia a Este do cabo fique protegida e com um extenso areal. A essa areia juntam-se as incontáveis conchas e corais que proveem dos recifes que circundam as tais ilhas da zona. Há zonas da praia em que a praia são conchas e corais. 
Esta é a explicação geológica da beleza da zona. Uma praia infindável cheia de conchas que a nós nos parecem exóticas, ilhas ao largo, águas calmas e quentes e vida marinha por todo o lado. Para um geólogo, mesmo a vida marinha morta na praia - leia-se as conchas - é interessante. Não tivemos oportunidade de explorar mas o hotel contiguo é também um centro de mergulho e snorkeling. Aparentemente um dos melhores de Omã. 
Vista semelhante na maré baixa com muita bicheza nas poças
Já era bom mas ficou melhor visto que a temperatura e humidade estiveram sempre baixas (i.e. ligeiramente abaixo dos 30ºC) devido a um "pedaço" da monção que nesta zona só deu vento mas nas montanhas deu chuva e inundações. Foi de curta dura, na semana seguinte voltámos aos 35ºC que com humidade se sente como mais de 40ºC...


sexta-feira, 2 de agosto de 2013

O Ramadão é como o Natal

Sinta-se próximo do divino e ganhe um Pajero
Gostaria de vos arranjar uma ligação histórica e/ou teológica sobre os estes dois eventos de duas religiões. Se há, não é dela que vos vou falar. O Natal não é celebrado por cá, pelo menos da mesma maneira, embora o Islão reconheça Jesus (e também Moisés) como profetas. Essa relação inter-religiosa dará para outro post ou para várias teses de doutoramento.
Durante o mês do Ramadão, os cinco pilares do Islão são relembrados em toda a sua pujança. Eles são, muito resumidamente: A fé, a reza, o jejum (durante o Ramadão), caridade e a peregrinação (a Meca claro). Apesar de não estarem inscritos no Corão, estão num dos escritos sobre a vida do profeta e são aceites pela maioria das vertentes do Islão. Pilares significa que são as bases para qualquer crente. Como um cristão rezar, celebrar o Natal, Páscoa e todos os rituais associados.
Na prática isso significa que durante este mês cerca de um bilião de pessoas não come entre o nascer e o pôr do Sol (acho que há horários especiais para a Escandinávia), faz várias rezas e come várias vezes durante a noite, restringe as suas atividades lúdicas e faz oferendas para a caridade. Quem tem possibilidades escolhe o Ramadão ou as semanas logo a seguir para o Hajj, a peregrinação a Meca. Os resultados esperados passam por uma ligação mais próximas com o divino, ajudar os carenciados e celebrar a sua religião. Começam a ver as relações com o Natal? Há peditórios e campanhas de recolha de comida e roupa por todo o lado. As parecenças continuam a um nível mais terreno. Todos os supermercados e lojas têm promoções, há várias comidas, em particular os doces, especiais para esta altura do ano e os locais - apesar do jejum diário - têm um regime hipercalórico. Nós enfardamos durante um mês durante o dia, eles durante a noite. É também uma época para visitar a família e estar com os mais próximos. Igualmente semelhante ao nosso Natal são as viagens pelo país e a sinistralidade rodoviária... E não há cá operação Natal Seguro, é só mesmo guiarem ensonados, esfomeados, sem cinto de segurança, a falar ao telemóvel e claro, com a família ao monte no banco de trás. Parece a preparação de uma música de Graciano Saga. Inshallah não vai acontecer nada.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Ramadão: primeiros sintomas

O Ramadão é o nono mês do calendário muçulmano. Como é um calendário lunar começou na última lua nova, dia 10 de Julho - na verdade começou quando se observou claramente no céu, a lua nova astronómica foi dia 9. Dura este ciclo lunar e para quem segue a religião de Maomé dura e custa muito todos os dias. Estamos no meio do Verão e na península Arábica isso significa longas horas de sol, calor, humidade alta e uma noite só muito ligeiramente mais fresca. Tudo isto sem água nem alimento.
Sendo considerado um dos cinco pilares do Islão, espera-se que todos os muçulmanos jejuem e sigam as restrições vigentes. Em Mascate, para um ocidental que não segue a religião local há também regras. Não tem de jejuar nem ter todas as outras restrições, mas não pode ser visto a fazer nada do que os muçulmanos não podem fazer neste mês. Embora haja salas nas empresas para os infiéis reporem os níveis de açúcar e cafeína, a verdade é que não dá jeito nenhum lá ir sempre que se precise de beber água ou comer. Assim sendo muitos acabam por comer ao almoço em casa ou noutro sítio escondido e voltar ao pecado só depois de voltar do trabalho.
Outra diferença é que por razões de segurança - e acreditem que são sérias - o sector público e muitas empresas definem um horário para os fiéis que acaba às 13h. São repetidos exaustivamente os apelos à condução segura e para que não o façam se sentirem cansados, irritados, com fraqueza ou outros sintomas... ora isso é quase inevitável durante este mês visto que para além do calor durante o dia, não comem nem bebem, os que fumam não fumam e a noite é passada quase na totalidade em rezas e refeições. Sem surpresa a sinistralidade rodoviária triplica durante este período (durante o resto do ano é a mais alta do mundo - dos países que contabilizam, claro). As horas que antecedem o Iftar, a quebra do jejum, são as piores, já presenciámos situações muito próximas de acidentes, ou melhor incidentes, porque eram manobras loucas de condutores fora de si.
É suposto ser o mês da introspeção, caridade e adoração, mas para quem não é crente a visão é bem diferente.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Energia solar e... tomates

O sol é muito, constante e impiedoso para quem tem o infortúnio de ter de trabalhar debaixo dele durante o Verão. A Arabia Felix (mal traduzida para Arábia feliz, na verdade é Arábia fértil) não fica aqui, é mais a Sul onde a Monção permite o verde. Corresponde ao actual Iémen e Dhofar omanita. Apesar de estarmos não muito longe do equador, o Verão tem mais horas de luz do que o Inverno - uma ou duas - o que não ajuda. Quando o céu não é azul significa que a névoa que encobre o Sol é a humidade que se aproxima dos 80%... trópico de câncer no seu esplendor. E a noite, por causa dessa humidade, só não tem o Sol porque a temperatura não varia
Com todo este Sol pensaría que a energia solar seria uma fonte bem aproveitada. E é, mas involuntariamente. Quase todas as casas têm um tanque de água no telhado de onde vem a água para as torneiras. Nos dias de calor sabe bem refrescar as mãos e cara com água fresca. Mas não em Omã... a água "fria" é quente, não morna, quente, o suficiente para tomar banho sem ligar a água "quente". O truque é desligar os cilindros de água quente e aproveitar a água fria que deles sai ligando a água "quente".
Ponto de partida
Aproveitamento mais tecnológico da energia solar é ainda pouco, mas com honrosas excepções. Há o ocasional painel de solar térmico em habitações - imagino que seja útil no Inverno - alguns bairros com iluminação pública autónoma, ou seja, cada candeeiro tem um painel solar associado para além de outros esporádicos exemplos. Provavelmente o melhor exemplo de utilização de energia solar é o projecto de Amal West. Um campo petrolífero no Sul do País relativamente grande mas com óleo pesado, difícil de extrair. Uma das formas de tornar o óleo mais móvel é aquece-lo ou misturá-lo com algo que o faça mais fluido. Uma solução frequente é ter uma pequena central térmica que queima gás ou outro combustível fornecendo a energia, geralmente sob a forma de vapor de água, injectada para o reservatório permitindo a produção do óleo. Naturalmente não é uma forma muito eficiente nem amiga do ambiente de o fazer. Recentemente foi testada com sucesso uma técnica de produção de vapor de água para injeção em reservatório usando como fonte de energia o Sol. Um conjunto de painéis solares à superfície concentram energia sob a forma de calor em tubagens, vaporizando a água que é injectada em profundidade, transmitindo o calor à rocha reservatório e ao óleo. Os resultados foram muito bons e o projecto está em fase de aplicação a escala real. Podem ler mais sobre isto aqui e aqui.
Ponto de chegada
Voltando ao aproveitamento da energia solar com aplicações mais básicas e desta vez voluntárias, eis que entram os tomates. Aproveitando o calor intenso, Sol e algum vento resolvi secar vegetais. Tomates são o mais comum e podemos vê-los no supermercado. São, contudo, geralmente caros e ao que parece frequentemente secos com produtos químicos, de forma semelhante a muitos enchidos que são fumados com "fumo líquido"... nem quero imaginar a surrapa que isso significa. Pelos menos nos Estados Unidos as empresas que os comercializam podem chamá-los tomates secos ao Sol, mesmo quando não são... Espero que na Europa seja mais controlado. A receita artesanal é simples e suponho que facilmente aplicável em Portugal nos meses de Verão. Omã produz muito tomate e é geralmente muito bom. No meu caso foi aproveitar os 5 ou mais kilogramas da palete que comprei a um vendedor de estrada à porta da empresa. Num tabuleiro - eu usei o preto do fogão - cortar tomates bem maduros às metades. Se forem muito grandes podem ser aos quartos. Vi receitas que diziam para tirar as sementes e polpa, mas não o fiz e não parece ter nenhuma influência na qualidade final. Colocar algumas pedras de sal grosso sobre a superfície cortada do tomate. Por umas gotas de vinagre em casa um. Afasta insectos e realça o sabor. Mantendo a superfície cortada para cima, por os tomates ao sol. Tapar o tabuleiro com uma rede fina ou pano translúcido para evitar insectos e poeiras, garantindo que não toca nos tomates.
No nosso terraço demorou 3 dias a ficarem no ponto: secos, com cheiro intenso característico dos tomates secos, mas ainda maleáveis. Deixar demasiado tempo faz com que fiquem quebradiços, uma casquinha de tomate. Com dois tabuleiros ficámos com tomate seco fantástico para o resto do ano. Beringela é o vegetal que se segue.

domingo, 2 de junho de 2013

Mais a Sul em Sur

Sur
Com 3 dias de fim de semana para aproveitar e tentando ignorar as temperaturas que teimavam não descer dos 40°C fomos explorar a zona de Sur. Desde há muito um porto importante, inclusive com construção naval, que perdura até hoje, foi também ocupado pelos portugueses quando cá estiveram. A enorme baía de Sur que por pouco não é uma laguna, forma um abrigo natural e naturalmente um porto e local de ocupação humana. Esquecendo algumas construções claramente fora de formato, souberam manter o casario baixo e integrado na arquitectura local. 
Outra vista da baía de Sur
Pelo que percebi as duas margens separam duas tribos, uma historicamente ligada ao comércio - até há não muito tempo de escravos - e a outra dedicada à construção naval, essencialmente os dowhs, embarcações tradicionais em Omã com capacidade de navegação em alto mar. As caravelas cá do sítio. Não estranhamente a margem Sul, ligada ao comércio, tem os edifícios maiores e mais elaborados.
Parte da viagem foi para ver uma das maiores atracções turísticas da zona: tartarugas marinhas que desovam aqui todo o ano. Ao longo dos muitos kilometros de praia - a grande maioria desocupada - com areia quente o ano todo, várias espécies de tartarugas marinhas, todas as que existem no Índico segundo percebi, passam por aqui para desovar.
Golfinhos ao largo de Ras al Had
O pico é durante Novembro quando também se vêem as pequenas a emergir dos ovos. Nós só vimos duas a desovar e voltar para o mar. Tudo durante a noite e de forma muito controlada. É um parque natural com acesso restrito (sem fotos...) e pelo que vi a protecção funciona mesmo. Uma boa combinação de turismo da natureza e conservação.
Também na mesma zona há viagens de barco para ver golfinhos e outra bicharada marinha. Menos profissional mas ainda assim respeitador, não abalroamos nenhum cetáceo. E com fotos! Na volta deu ainda tempo para ver um dos dois wadis com água o ano todo desta zona (deveriam ser oueds?). Wadi Tiwi, um sítio a voltar.
Wadi Tiwi

domingo, 26 de maio de 2013

Omã



Castelo de Bahla

Antes do pai do actual Sultão unificar todo o território e ter conseguido ainda anexar umas partes do empty quarter (zona desértica enter os Emirados, Omã e Arábia Saudita), o país chamava-se Mascate e Omã. Mascate referia-se a toda a zona costeira que o Sultão controlova e Omã ao interior montanhoso e desértico que era controlado de facto pelo Imã. Houve até tentativas de autodeterminação junto das Nações Unidas e de reconhecimento pelos países vizinhos. A capital de Omã era Nizwa, a maior cidade, ainda hoje, nas montanhas Hajar e o ponto de controlo do Imã.
Forte de Nizwa
Foi essa zona que fomos visitar durante um dos fins-de-semana prolongados que por uma razão ou por outra parecem ser comuns por aqui. Quando me falaram em montanha imaginei estradas íngremes de montanha, tipo Pirinéus ou pelo menos Serra da Estrela, cidades ao longo de encostas com casas tortas e míudos que perdiam para sempre a bola quando a chutavam com demasiada força. Há montanha, mas os vales são tão largos que se pode viajar por grande parte da cadeia em declives muito suaves. Naturalmente a maior parte das estradas estão construídas ao longo desses vales assim como muitas das cidades e vilas. A planura dos vales é tão grande que é difícil perceber para onde escorre a água. Apanhámos ainda algumas estradas onde corria água – no rescaldo das chuvas das semanas anteriores – embora todas transitáveis. Em Nizwa a estrada de acesso ao centro histórico e um grande parque de estacionamento são no próprio wadi. Acreditam mesmo que não chove, de modo que quando isso acontece, ficam com um rio no meio da cidade.
Misfat
Em Nizwa vi o primeiro canhão português. O mais estranho é que os portugueses nunca aqui estiveram, o controlo desta zona foi sempre junto à costa. Para além do português estavam canhões suecos, ingleses e de outras paragens que segundo as pancartas vieram cá parar numa das reconstruções do forte, bem depois dos Portugueses terem saído do Golfo Pérsico. Não conseguimos ver muito mais que o forte e algum dos edifícios em volta porque caiu uma carga de água que nos forçou a voltar para o carro e seguir caminho esperando que os wadis não enchessem demasiado.
O que deu para ver em Nizwa e em muitas outras cidades e vilas desta zona foram as casa de lama, na maioria desabitadas e em ruínas. O método de construção mais comum nesta zona, mesmo onde há pedra em abundância, era a construção em blocos de lama secos misturados com palha ou raminhos formando paredes, depois revestidas com outra camada de lama ou, suponho que nas casas mais nobres, com estuque. É pena ver que bairros inteiros destas casas estão agora ao abandono, mas por outro lado compreendo que em tempos modernos e com algum dinheiro seja mais fácil construir uma casa nova do que reabilitar casas de lama sem água, luz ou saneamento.
Um dos largos vales por entre as montanhas
A montanha digna desse nome só fugindo das estradas principais e ir no sentido de Al Hamra (o vermelho) e mais além até Misfat. Aí sim, em estrada de montanha e fomos presenteados com uma das últimas aldeias de lama ainda “vivas”. Em todos os sentidos, com pessoas a viver nas casas, jardins luxuriantes de tamareiras e água, muita água, em várias falajs que atravessam a aldeia. Há inclusivé uma piscina comunitária – na verdade um dos tanques das falajs – onde a miudagem se refresca em grande. O mais impressionaste é que é um ponto de vida no meio de montanhas austeras sem, aparentemente, uma gota de água. A minha ideia de oásis era outra, mas parece que o conceito é mais lato.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Abril águas Mil


Escrevo com um atraso de um mês.Tentei lembrar-me de um provérbio que rimasse com tempestade tropical, mas não encontrei nenhum. Quando as temperaturas pareciam continuar a subir lenta mas seguramente para cima dos 40ºC, eis que vem a chuva. E quando veio, veio forte. Em Mascate choveram cerca de 5mm em poucos dias (o que é suficiente para inundar muitos sítios), mas nas montanhas foram mais de 50mm, algo como 1/3 do total anual… Há feridos e mortos a registar levados pelas torrentes de lama de destroços. Foram logo menos 10ºC e vento fresco. No início muito bem vindos, mas depois a realidade da infraestrutura Omanita veio ao de cima. Assim como os Portugueses acreditam piamente que não faz frio em Portugal e por isso não isolam as casas, os Omanitas acreditam profeticamente que não chove em Omã. Assim sendo não é preciso ter sarjetas nas ruas, não é preciso que as ruas tenham um declive para a água escoar para a sarjeta ou ribeiro mais próximo e evidentemente não é preciso tapar buracos no telhado ou isolar janelas para não entrar água. Assim, para além das muitas poças na rua – um eufemismo para lagoas em todos os baixios da cidade - havia poças dentro de casa… um problema ainda não totalmente resolvido mais de um mês depois. 
Dois dos concorrentes
Interessante foi ver os locais num concurso involuntário de mister dishdasha molhada e miss abaya molhada. Tenho a dizer que continuam muito pouco reveladores.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Assentamento

O contentor que transportou os pertences de Portugal
Escrevo com um atraso de semanas. Os nossos pertences foram entregues na casa definitiva e já nos mudamos. Os primeiros tempos foram de pequenos arranjos, pequenas inundações e muita tralha por arrumar (que continua em caixotes)... Aos poucos arranjamos a mobília que falta, com opções limitadas visto que os locais e muitos dos estrangeiros gostam de mobiliário digno de palácios imperiais romanos ou jogador de futebol que foi para a Rússia. O tema vale um post separado ou mesmo uma tese de doutoramento sobre design de interiores.
Há a hipótese de ir ao ikea nos emirados mas há também os classificados dos estrangeiros que de repente são enviados para outro país e têm de vender a mobília toda que compraram há 6 meses. Os recém-chegados agradecem.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Walking the wadi


Um dos flancos do wadi em Yitii
Pensava que o termo wadi era uma das variações da palavra wued, ambas referentes a ribeiro ou rio. A última é um termo usado no Norte de África e que em Espanha e Portugal deu origem a Guadiana, Guadalquivir e outros rios e ribeiros. A comentar a origem destas e outras palavras no Português e Espanhol com omanitas, foi-me explicado que as duas não são sinónimos nem variações, simplesmente uma refere-se a rio perene (wued) e outro a rio intermitente (wadi). É interessante observar como a geografia influencia a língua. Pelo que sei não temos (nem os espanhóis) palavras específicas para estes conceitos. E o facto de na Península Ibérica ter ficado só com o termo wued. É seco mas nada comparado com maior parte dos países árabes.
Pequeno wadi em Yitii
Ao explorar um pouco de Omã, percebe-se a relevância de ter os dois termos. Quase todos os vales, mesmo os que têm origem nas montanhas onde chove mais são intermitentes. E destes a esmagadora maioria não tem água a correr no inverno: são quase sempre secos com inundações catastróficas quando passa por cá a monção ou outra tempestade mais forte. Para conter as torrentes e aproveitar alguma dessa água várias “barragens” estão ou já foram construídas no sopé das montanhas para que a água infiltre quando há cheia. Uso as aspas porque estas barragens são basicamente muros de pedra com poucas dezenas de metros de altura e vários kilometros de comprido, a cortar vales gigantes sem uma gota de água. À superfície.
Mesmo nas zonas aparentemente mais secas é interessante observar que há vegetação. Pouca mas constante e muitos dos vales estão cultivados, alguns com plantações de sequeiro como as tamareiras (que dão tâmaras bem boas, mesmo para quem não costuma gostar como eu) mas também outras árvores de fruto e vegetais que certamente precisam de mais água. Esta tem origem nos muitos poços que existem nos vales que indica que a água subterrânea abunda ou pelo menos existe em quantidade suficiente. 
Uma das "barragens" na zona de Sohar
Outra fonte de água, ainda hoje usada, são as falajs, um feito da engenharia antiga. As mais simples são como as levadas da Madeira que transportam água ao longo de canais a partir de uma fonte. As mais complexas nos sopés das montanhas envolvem poços verticais de algumas dezenas de metros até ao nível freático e galerias horizontais ou levemente inclinadas ao longo de kilometros (!) até à zona de costa ou vales mais longe das montanhas. Ao longo do percurso há poços onde a água é extraida para uso doméstico e agricola. Existem há mais de 1500 anos e a sua origem é debatida. Já vi escrito que tiveram origem na Pérsia, onde também são usadas, mas os omanitas reclamam-nas como suas. Vejam mais aqui.
Quando vir uma a funcionar reporto.

quinta-feira, 7 de março de 2013

A costa



O ponto de partida
Já tinha visto parte da costa a Sul de Mascate, na zona de Qantab, Yitti e Al Bustan. Mas de terra. Agora foi a vez da vista de mar. Evitando os preços dos barcos de recreio da marina, seguimos para Qantab, e um dos locais, ajudado por miúdos que pareciam estar a poucos anos de se tornarem lobos do mar, levou-nos para uma volta junto à costa a Sul e Sudeste de Qantab. Preço regateado claro! A costa, muitíssimo recortada, com muitas enseadas com praia, algumas delas só acessíveis por mar. As mais pequenas imaculadas, pequenos paraísos. As maiores, quase todas, com resorts de luxo, em funcionamento ou em construção. Com certeza levarão mais pessoas a estas zonas, mas infelizmente só as com dinheiro suficiente… O mar parecia calmo nas enseadas protegidas, mas fora delas ainda deu para uns belos banhos sempre que o barco dava chapadas na água. Para quem gosta de aves, é fantástico, águias pesqueiras, abutres, rabos-de-palha, garças e muito mais. Não deu para fazer snorkeling, mas certamente seria bom. 
Um dos resorts
Dá para perceber a dificuldade de manter o controlo de uma área tão extensa de costa, tão recortada, controlando apenas os portos. Devia ser impossível prever ataques vindos do interior e nalguns sítios devia ser possível esconder uma armada inteira de navios em algumas enseadas sem serem facilmente detectados. Talvez por isso tenhamos conseguido repelir os ataques dos turcos e persas mesmo quando surgiam com grandes armadas, mas não os dos omanitas que vinham do interior

Um dos vários ilhéus

Fica a nota mental para explorar esta costa, a 20 minutos de casa. Também para explorar, por indicação de um colega português, uma destas enseadas só acessível por mar, mais perto de Mascate, conhecida localmente como o cemitério dos Portugueses. Soa a uma boa saída.

segunda-feira, 4 de março de 2013

A mesquita do boss



É impossível passar despercebida. É grande, em área e altura e está mesmo ao lado da maior autoestrada do País. Um local disse-me que era a maior do mundo, mas depois de a googlar deu para ver que o mais próximo disso é ser a segunda maior em termos de área. A Grande Mesquita Sultão Qaboos tem capacidade para 20000 pessoas e há outras que têm capacidade para muito mais. Parece que o interior tem o segundo maior tapete do mundo, a cobrir toda a sala principal de oração (a dos homens claro). O candeeiro parece que é também o segundo maior. Os rankings são só isso mesmo.
Todo o espaço é muito agradável, muitíssimo bem cuidado, com um grande jardim à volta. A arquitetura foi muito bem conseguida, é grande sem ser opulenta e do pouco que percebo, respeitando o estilo local. É a grande mesquita do país, algo equivalente às Sés em Portugal.
Para além de atrair crentes, atrai os adolescentes locais com aro bikes, skates e afins mas que se mantêm a uma distância respeitosa da zona central. Para os não-muçulmanos a entrada é proíbida, mesmo nos pátios interiores. Algo que só me apercebi depois de lá ter estado e fotografado. Se não houver guarda e/ou o aspecto não for demasiado de turista, não deve haver problema. As salas de oração é que estão mesmo restritas a quem é muçulmano e dentro destes penso que só os Ibadis (a fação cá do sítio).

sexta-feira, 1 de março de 2013

Nome errado, comida na conta certa



Aproveitando o fim de semana e a companhia de amigos em visita voltei a explorar a costa a Sudeste de Mascate em Al Sidiya. Os barcos de pesca em Portugal normalmente são boa indicação de um ou mais restaurantes com peixe fresco e, espera-se, bem cozinhado.
Já tinha identificado um peixe da família da dourada (robalo, dourada, sardinha, sempre uma escolha certa, sustentável e saborosa) que abunda nestes mares, entre as várias dezenas que se podem encontrar nos mercados e restaurantes. Nesse aspecto parece ter mais variedade que em Portugal onde alguns peixes parecem estar restritos a cantinas (redfish, abrotea, maruca, etc), outros a restaurantes e depois alguns peixes que só parecem ser comprados e comidos em restaurantes especializados que ficam no vale de cu de Judas junto ao mar onde o pessoal vai em romaria só para comer esse prato. Os mais populares por aqui são o hamour (garoupa) e o kingfish (não sei o nome em Português, só em Árabe :) ). Talvez por isso mesmo estejam na lista de peixes cujo stock esteja sobre-explorado (ver mais aqui).
Felizmente, como em Portugal, a dourada, faskar por estes lados, tem os stocks em bons níveis e não há sobrepesca. Também como em Portugal é muito saboroso!
Vai lá com a mão!

A bela da tasca à beira da estrada, tinha como algumas em Portugal, erros ortográficos no inglês, a começar pelo nome do sítio. Será que também é uma indicação universal de boa comida? Comida omanita, clientes omanitas, cozinheiros paquistaneses. Comer com a mão claro. O peixe não vem grelhado, mas frito, bem condimentado e ligeiramente picante. A acompanhar arroz tipo byriani e salada não condimentada. Molho carilento e picante para quem quiser. Os amigos escolheram um shaari eshkeli (não faço ideia do nome em Português) e estava também muito bom. Sou esquesitinho na qualidade do peixe e na forma como é cozinhado, mas este sítio encheu-me as medidas. Com amigos então, é do melhor. Só falta conseguir comer o arroz sem ficar com metade na barba. É pena que esta boa comida não se veja mais. Os restaurantes que não são tasca têm indiano, libanês, iraniano, tailandês mas pouca coisa omanita. Talvez seja a falta de clientes, especialmente os expats que acho que não se aventuram muito por sítios que não tenham um ar moderno. Viva a tasca!
Nome errado, comida certa

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A feira



Este “velhote” esteve meia
hora a saltar numa luta de
espada encenada
Durante um mês por ano decorre o Muscat Festival. Este ano foi separado em duas zonas, ambas fora de Mascate, o que não dá muito jeito para ir ao fim da tarde, mas ainda assim esteve sempre cheio de gente. Foi interessante ver o conceito porque tem tudo o que se pode esperar encontrar num festival de artes (mais virado para as famílias) embora sem álcool nem drogas claro. Mas também tudo o que se pode esperar encontrar numa feira de produtos regionais, um pouco de feira popular e ainda uma pitada de stand de automóveis. Vou propor aos organizadores chamar-se FAECO - Feira das Actividades Económicas e Culturais de Omã. Ao estilo da quase homónima que se realiza em S. Teotónio para o concelho de Odemira. Nem faltavam os churros, ou algo similar. Havia também o mobiliário feito com palmas, desde a caixinha para o faqueiro até ao roupeiro, alguma bijutaria, as chibatas para os camelos, os kanjars, dishdashas e outra indumentaria.
Mini churros
Como ainda não me aventurei para muito longe de Mascate ainda não vi muito. No festival o que se podia ver do resto do país, para além de várias versões de crepes com ovo, natas azedas e mel – bem bom posso atestar – e outras iguarias culinárias era a diversidade genética deste povo. Em Mascate há alguma diversidade, mas uma pequena amostra pelos vistos. Pessoas com cara de etíopes puros, outros africanos que imagino tenham origem na zona de Zanzibar que foi omanita até à pouco tempo, para além do pessoal com caras árabes (embora já não tenha bem a certeza do que isso significa), paquistanesas (Omã também controlava parte desse território) e claro, toda a mescla destes povos. 
Não há homem da cerveja, há homem do chá
Até aos anos 50 havia escravos africanos, embora já integrados na sociedade e rapidamente absorvidos quando a escravatura foi abolida. Importa dizer que o conceito de escravidão não era o mesmo que temos da altura das nossas descobertas. Pelo que sei eram principalmente soldados. Também na absorção de outras culturas e etnias somos semelhantes aos Omanitas, embora o tenhamos feito ao longo de mais séculos e não tenhamos mantido a escravatura tanto tempo.

Os reis da chanata



O código de vestuário na empresa é camisa de manga curta ou longa, calças que não de ganga e sapato fechado. Para os expatriados. Os locais, orgulhosos da sua tradição vestem-se com a dishdasha e no pé, supostamente também uma tradição, a bela da chanata. As mulheres expatriadas têm mais liberdade e a chanata é-lhes permitida. Ora, para um país em que as temperaturas mínimas no inverno não baixam muitas vezes dos 15ºC – à noite claro – a chanata faz todo o sentido. Infelizmente não posso invocar a tradição do meu país, não me lembro dos campinos ou as minhotas com os seus oiros usarem chanata. Só os pescadores do Guincho, mas acho que não se qualifica como traje tradicional. Ainda pensei usar mais um paleio proto-colonialista, neste caso tanga proto-colonialista de terem sido os portugueses a introduzir a chanata no país, no longínquo século XVI. Al-Chanata como se dizia na altura. Seria como dizer que foi a dinastia Filipina que introduziu o bacalhau salgado em Portugal. Para mim, adepto da chanata, com meia de preferência (aliás tema do meu primeiro blogue, feito em conjunto com outra pessoa que era contra mas desistiu por não ter argumentos), é chato. Em casa e durante o fim-de-semana não há sapatos, mas depois há 5 dias inteiros de pés a cozer…

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Entrada proíbida



Já me tinha perguntado onde era a secção de produtos suínos nos supermercados cá do Sultanado. Tinham-me dito que era uma portazinha escondida na zona do talho. E os expats comentam uns com uns outros que aquele supermercado é que é, o bacon é muita bom, mas o outro tem umas costeletas melhores e por aí fora (chegarei a esse ponto?). Ainda não tinha sentido muita falta do porco e talvez por isso sempre tenha passado por essas portas e pensado que eram os arrumos ou a zona refrigerada. Eis que a vejo, com todo o esplendor, bem fechada e com vidros opacos. E mais, tem um botão para carregar e entrar, não vá um incauto omanita entrar sem querer e ver o mundo ímpio por detrás do portal.
Animado com curiosidade e a ideia de encontrar um presunto ou algo igualmente suíno e saboroso entro e descubro que um terço ou mais dos produtos têm essência suína mas não o são. Batatas fritas, tostas, patés e outros produtos processados. Dá que pensar na quantidade de proteína suína (e animal em geral) que comemos sem o saber neste tipo de alimentos. A carne propriamente, só ultracongelada com aspeto não muito bom, provavelmente produzida do outro lado do mundo.
Restavam os chouriços, presuntos e afins. Espanhóis, claro, e umas fatiazinhas de salame e chouriço são uns módicos 4 ryals, perto dos 8€… com saudades mais ainda não desesperado.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

A herança Portuguesa em Omã III



Mais um passeio, desta feita a Norte de Mascate, ao longo da extensa planície costeira de Batinah. A zona extende-se de um pouco a Norte de Mascate até à fronteira com os EAU. As montanhas ficam a uns quantos kilometros da costa e toda a área entre estas e o mar é muitissímo plana, composta pelos depósitos aluviais das montanhas (são os clássicos debris flows, aqui com dezenas de metros de espessura). Quase toda a chuva que cai nas montanhas é escoada à superfície e principalmente subterrâneamente, em direção à costa, através destes depósitos, fazendo deles um excelente aquífero. Não estranhamente esta é das zonas da península arábica mais férteis e densamente povoadas – para padrões de península arábica – e de facto muitos dos produtos omanitas que se vêem nos supermercados são produzidos nesta zona.
A capital desta zona é Sohar, referida nos textos portugueses como Soar. Foi, pelo menos desde o tempo dos antigos gregos um importante interposto comercial para as rotas vindas do extremo oriente e o ponto de exportação do cobre que ainda hoje é produzido nas montanhas circundantes. E claro está, estratégica como era, foi conquistada pelos portugueses e há ainda um forte por nós construído ou reconstruído.
Encontrei uma referência a esta cidade num texto João de Barros na Primeira Década da Ásia, dos feitos que os portugueses fizeram no descobrimento dos mares e terras do Oriente, Livro IX, Cap. I de 1522 (vejam o interessante blog sobre as cidades Portuguesas referidas nos Lusíadas aqui):
(…) té o cabo Rofalgate, que está em vinte e dous graos e meio, e será de costa cento e vinte leguas, toda he terra esteril, e deserta. Neste cabo começa o Reyno de Ormuz, e delle té o outro cabo Monçadan haverá oitenta e sete leguas de costa, em que jazem estes lugares do mesmo Reyno, Calayate, Curiante, Mascate, Soar, Calaja, Orsaçam, Dobá, e Lima, que fica oito leguas antes de chegar ao cabo Monçadan, que Ptolomeu chama Asaboro, situado per elle em vinte e tres graos e meio, e per nós em em vinte e seis, no qual acaba a primeira nossa divisão. E a toda a terra que se comprehende entre estes dous termos, os Arabios lhe chamam Hyaman, e nós Arabia Feliz, a mais fértil, e povoada parte de toda Arabia.
Só reconheço alguns dos topónimos referidos e a Hyaman referida parece corresponder à costa de Batinah como é hoje chamada e a zona costeira montanhosa a SE de Mascate. Monçandan é a península que forma o estreito de Ormuz (nome que corresponde na verdade à ilha do lado Iraniano). O cabo de Rofalgate fica a SE de Mascate, sendo o ponto mais oriental da península.
Omã ou uma velha adega no Alentejo?
Ao contrário de Mascate, em Soar não há rochedo onde construir o forte de modo que este está sobre uma pequena elevação junto ao mar e tem pouco mais do que uma muralha e algumas construções no interior. Uma parte do terreiro tem a descoberto escavações arqueológicas que mostram construções referidas na pancarta como sendo anteriores aos portugueses e eventualmente até pré-islâmicas. No meio do terreiro um canhão muito degradado possivelmente português, mas não consegui ver. Claramente posterior é a torre quadrada no centro do forte que vai albergar um museu sobre a história do forte e desta zona. Deve valer a pena cá voltar quando abrir!
Mais uma vez gostava de conhecer mais sobre história da arte, em particular da arquitectura. Edifícios circulares com 1 ou 2 andares e uma entrada. Já os vi no Alentejo. Até com as ameias. Os arcos e a disposição das janelas e portas parece familiar, com cunho português, mas algumas dessas coisas associo à influência árabe em Portugal de modo que se torna difícil perceber qual a sua origem. West meets East na sua forma mais interinfluenciada.